sexta-feira, junho 10, 2005

Engenharia Genética e Liberalismo.

No artigo “Rawls e a Engenharia Genética”, Manuel Meneses de Sequeira aprecia o enquadramento da engenharia genética nos escritos de John Rawls. (vide http://www.causaliberal.net/documentosMMS/rawlseg.htm).
O escrito afasta uma certa Engenharia Genética dos preceitos liberais.

Em essência estou integralmente de acordo com Rawls quando afirma “é do interesse de cada um possuir maiores bens naturais” (é esta uma afirmação nuclear do conceito liberal). Como consequência é legitimo que “as partes pretendem garantir aos seus descendentes o melhor legado genético”. Assim, “a prossecução de políticas razoáveis deste ponto de vista é algo que as gerações devem às que se lhes seguem […]” e, “ao longo do tempo, a sociedade deve tomar medidas para pelo menos preservar o nível geral de aptidões naturais e para prevenir a difusão de defeitos graves”, podendo mesmo conjecturar-se que “a longo prazo, se existir um limite máximo das aptidões, se atingirá por fim uma sociedade com a maior liberdade equitativa cujos membros gozam do maior talento equitativo”.

A divergência começa, em relação ao defendido por Francis Fukuyama, quanto à actividade reguladora do estado para estes casos. Isso seria condicionar de modo sistemático a essência do Homem. Planear geneticamente um Homem modelar seria permitir, sob a fachada de criar um Homem com majoração de aptidões, limitar a liberdade de ser humano. Quem, ou que entidade passaria a ter poder de controlo sobre a definição da base genética a ser opção para a sociedade optimizada? Como seria possível avaliar a bondade das opções tomadas? Este parece-me ser o melhor caminho para condicionar a condição humana, coarctando o Homem da liberdade de que não sentirá sequer necessidade.

Será o indivíduo que não reclama os valores liberais, porque nunca lhe foram apresentados, livre?
Houve quem o tentasse, com ferramentas sociais, nomeadamente vedando aos cidadãos o acesso à cultura.

Quem conhece neurologia sabe que é possível amputar o ser humano da crítica, bastando para tal eliminar uma área específica do córtex frontal. Este ser humano pode mesmo ter aptidões que o tornem extremamente competitivo em várias áreas da vida social. Faltar-lhe-á algo de fundamental na vida de relação, a possibilidade de expressar emoções. Esta não é certamente uma visão liberal do indivíduo em sociedade.

Esta é, em última análise, uma imagem do oposto do conceito liberal. Uma sociedade em que os seus elementos vivem realizados, porque cumprem estritamente o papel social que lhes assiste. Não tendo qualquer pulsão que questione, em tempo real, o papel lhe é atribuído. Porque alguma entidade o condicionou, de modo genético, cirúrgico ou medicamentoso. Esta poderá ser uma aproximação ao ideal Comunista, não ao Liberal.
Retirar do Homem o que o torna insatisfeito com as realizações passadas, é retirar-lhe o impulso motivador de novas realizações. Tirar ao humano a pulsão que o move, no sentido de ser mais competitivo que o seu vizinho (com os mais variados fins, em última análise afirmando os seu genes como mais válidos), é certamente contrário ao conceito Liberal. É este o motor do desenvolvimento humano, aquele que tende a impulsionar o Homem para o desenvolvimento tecnológico. Desenvolvimento tecnológico que possibilitou chegar ao momento actual em que pudemos questionar e interferir com a essência da humanidade, talvez fazendo-a avançar por caminhos novos. Eliminar preconceitos e criar um ser novo (pós-humano?).

A base do Liberalismo será permitir à condição humana seguir um caminho de selecção natural, favorecendo os mais fortes, porque mais aptos a legar os seus genes. Não sendo um qualquer entidade reguladora (do Estado) a definir qual o melhor caminho para o espécie.

Por analogia ao que acontece com a economia, será previsivel que tal entidade acabe por corromper a competitividade, por leis de desciminação positiva carregadas de "boas intenções", destruindo os equilibrios estabelecidos pelas leis do mercado.