Ipsis Verbis: A revolução de Maio
Como nota Rui Ramos, num excelente ensaio sobre o 28 de Maio na revista Atlântico deste mês, a ideia original da ditadura era, para a maior parte dos seus apoiantes, cumprir a parcela consensual do programa da República e que ela não fora capaz de executar: equilibrar as contas públicas, desenvolver o País, difundir a educação e restabelecer a autoridade do Estado (...).
Nem a Ditadura nem o Estado Novo interromperam a democracia em Portugal. Apenas substituíram um regime terrorista e que nunca conseguiu encontrar um ponto de equilíbrio por um autoritarismo formalizado, o qual nem sequer impediu grande número de adesões, da esquerda à direita. É por isso que o regime de 1976 herdou dele mais do que julga. Afinal, o 25 de Abril foi feito por soldados com brilhantes carreiras militares e políticas no Estado Novo. José Saramago disse há uns anos que estávamos hoje na mesma situação em que estávamos antes do 25 de Abril. Em certa medida, teve razão. Para quem, em 1974-75, quis instaurar o comunismo, o que existe não pode deixar de ser mais ou menos o mesmo (o "fascismo societal", do prof. Boaventura Sousa Santos). Mas quem atribui valor aos mecanismos formais demo-liberais, percebe como isto que existe é bem melhor, mesmo se não tenha feito completa tábua rasa do que existia e nele tenha em parte a sua origem.
Luciano Amaral no DN [25.05.2006]
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