quinta-feira, maio 25, 2006

Ipsis Verbis: A revolução de Maio

Como nota Rui Ramos, num excelente ensaio sobre o 28 de Maio na revista Atlântico deste mês, a ideia original da ditadura era, para a maior parte dos seus apoiantes, cumprir a parcela consensual do programa da República e que ela não fora capaz de executar: equilibrar as contas públicas, desenvolver o País, difundir a educação e restabelecer a autoridade do Estado (...).

Nem a Ditadura nem o Estado Novo interromperam a democracia em Portugal. Apenas substituíram um regime terrorista e que nunca conseguiu encontrar um ponto de equilíbrio por um autoritarismo formalizado, o qual nem sequer impediu grande número de adesões, da esquerda à direita. É por isso que o regime de 1976 herdou dele mais do que julga. Afinal, o 25 de Abril foi feito por soldados com brilhantes carreiras militares e políticas no Estado Novo. José Saramago disse há uns anos que estávamos hoje na mesma situação em que estávamos antes do 25 de Abril. Em certa medida, teve razão. Para quem, em 1974-75, quis instaurar o comunismo, o que existe não pode deixar de ser mais ou menos o mesmo (o "fascismo societal", do prof. Boaventura Sousa Santos). Mas quem atribui valor aos mecanismos formais demo-liberais, percebe como isto que existe é bem melhor, mesmo se não tenha feito completa tábua rasa do que existia e nele tenha em parte a sua origem.

Luciano Amaral no DN [25.05.2006]

quarta-feira, maio 24, 2006

"País de doutores"

Ao folhear uma revista “Sábado” com uns meses (de Novembro de 2005) deparei com um artigo intitulado “País de Doutores” que comparava as habilitações literárias dos governantes de vários países da UE.

Segundo esse estudo em Portugal a totalidade dos Ministros são pelo menos Licenciados, possuído alguns Pós graduações e Mestrados existindo nestes três que são doutorados.

Na Grécia, tal como acontece em Espanha a percentagem de Ministros Licenciados, não sendo tão elevada como a portuguesa é de cerca de 90%.

Na Suécia (país que se encontra no 2.º Lugar no Índice de Desenvolvimento Humano das Nações Unidas) apenas 8 dos 22 Ministros têm formação Superior… Uma situação em tudo idêntica aos restantes países do norte da Europa.

Várias poderão ser as razões que podem explicar este fenómeno mas entre eles estarão sempre factores ligados essencialmente com a necessidade de reforçar a autoridade e a legitimidade com base em aspectos técnicos.

A verdade é que um político deve ser um interprete da vontade comum e para isso mais do que Canudos é essencial Bom Senso…

"Dura praxis"

Segundo os dados obtidos por um inquérito, realizado, a 2819 alunos da Universidade de Coimbra, hoje apresentados no colóquio internacional "Movimento Estudantil Dilemas e Perspectivas", na UC:

Quase um terço (32,3%) dos alunos da UC concorda com a prática de actos de "violência física ou simbólica" no âmbito da praxe académica.

"28% dos alunos discordam da ideia de que praxe deve ser facultativa e respeitar quem não quiser aderir".

Mais de 80% dizem-se favoráveis à discriminação sexual, recusando qualquer revisão do código da praxe que igualdade os direitos de homens e mulheres.

Só 3% dos alunos defendem que a praxe "deve ser completamente abolida, pois é uma violência".
Perante estes dados fica a pergunta: Serão estes tempos em que as Universidades se tornaram em incubadoras da barbárie e túmulos da civilização, ou são simplesmente sinais dos tempos?

terça-feira, maio 23, 2006

Ipsis Verbis: Ser oposição

No princípio era o PPD. Nasceu com o 25 de Abril, Sá Carneiro e a chamada ala liberal do antigo regime. O Partido cedo se mostrou popular, fazendo assim jus ao nome: Partido Popular Democrático. O Democrático deve ter sido acrescentado para desafiar a esquerda e mostrar reconhecimento pela chamada Revolução dos Cravos. Na altura, só a Esquerda era verdadeiramente democrática. Basta dizer que havia duas Alemanhas e só uma – a comunista – era “democrática”: a República Democrática (a outra era Federal – RFA).

No Portugal de Abril, a Direita desapareceu: o Partido menos à Esquerda denominava-se mesmo do centro – Centro Democrático e Social. O respeitinho é muito lindo. Quanto ao PSD, os seus dirigentes cedo perceberam que, para ganhar eleições, além de “democratas” precisavam de ser “sociais”. Daí a mudança de nome para Partido Social-Democrata. Foi assim que o País entrou na Era do Social. Socialistas e comunistas podem sempre ser vistos como sociais elevados à potência.

Evidentemente que na mudança de nome também pesou o medo. Toda a Revolução tem uma contra-revolução – os factos são sempre reaccionários – e por isso o PS um dia poderia sempre acrescentar um D ao nome. Certo é que a mudança de nome se traduziu em mais votos e fez do PSD a única grande alternativa ao PS. O País ganhou em estabilidade democrática, mas perdeu em pluralismo ideológico. E, com o tempo, descobriu-se que a grande escolha é, afinal, entre dois partidos sociais-democratas. Ou, se quisermos, entre dois Partidos Socialistas (embora um, como costuma dizer um amigo meu, seja a Diesel: PSD).
(Continua )

José Manuel Moreira no Diário Económico

segunda-feira, maio 22, 2006

Ocupar o Espaço

No discurso de encerramento do XXIX Congresso Nacional do PSD, Marques Mendes anunciou que, irá apresentar propostas para a reforma do Estado e da Educação.

Do seu discurso duas afirmações são de salientar:

1. «Este é o Estado mais centralizador da nossa vida democrática» a solução é o emagrecimento do Estado, ao contrário José Sócrates, opta pelo «aumento de impostos» para alimentar o “monstro”.

2. «Os portugueses podem ser emagrecidos, mas o Estado, esse continua a engordar».

A solução apontada é contratualizar alguns serviços importantes à sociedade civil. O apoio à família, aos idosos, aos toxicodependentes, a saúde, os transportes e a cultura, podem e devem passar para o domínio privado, só assim, os portugueses poderão ter acesso a serviços eficientes.

De facto, os cidadãos não podem andar sempre a pagar a ineficiência do Estado.

Quanto aos funcionários públicos, sabendo-se que a AP possui funcionários públicos a mais a solução politicamente viável é criar um programa de rescisões amigáveis na função pública... No entanto a solução dos fundos comunitários é que será questionável.

Outras foram as propostas apresentadas nomeadamente no domínio da Educação no entanto todo o ênfase deverá ser colocado nesta questão: Emagrecer o Estado.

Deste modo o líder Social-democrata mostrou que o Espaço do PSD não está ocupado como queriam fazer passar… Efectivamente a verdadeira reforma está por fazer e, como a história demonstra não será o governo Socialista a realiza-la…

quinta-feira, maio 18, 2006

Um primeiro teste

Segundo acabo de ler no Diário Digital a China, Cuba e a Arábia Saudita foram eleitas para o Conselho de Direitos Humanos da ONU.

A mesma notícia refere que o Conselho dos Direitos Humanos vai substituir a Comissão dos Direitos Humanos, sedeada em Genebra, desacredita pela presença entre os seus Estados-membros de países que violam os direitos humanos como China e Cuba.

De acordo com a mesma fonte esta eleição é considerada como o primeiro teste à credibilidade do Conselho dos Direitos Humanos, criado em Março passado, com a oposição dos Estados Unidos.

segunda-feira, maio 15, 2006

Ipsis Verbis: Falhar com competência

O actual Governo está em funções há mais de um ano e já é possível avaliar a sua actuação face à crise nacional. A conclusão é clara: a equipa de José Sócrates é séria, exigente, ambiciosa. Não vai conseguir nada, mas falhará com grande competência.
(...)
Sócrates chegou ao poder com o propósito aberto de fazer retomar a economia e a confiança aos portugueses. A primeira medida que tomou foi subir o IVA para 21% e deu cabo de tudo.
(...)
O verdadeiro problema que paralisa o País não é o défice acima dos 3% do PIB, mas o total da despesa pública, que é já metade do produto nacional, boa parte dela de esbanjamento de recursos.
(...)
Por isso, cada vez que aumenta o fisco, o Governo reduz o défice mas agrava o desequilíbrio, pois desculpa e confirma os gastos e adia a sua correcção. Ao subir o IVA, Sócrates pode ter comprometido a solução do País para os próximos anos. Isso era, aliás, o que o competente candidato José Sócrates tinha compreendido na campanha eleitoral, prometendo por isso não aumentar impostos. O Executivo parece o elefante que, depois de pisar uma perdiz, foi cheio de remorsos sentar-se no ninho para ajudar a chocar os ovos.
(...)
O peso morto dos gastos públicos leva Portugal a perder competitividade ininterruptamente há mais de dez anos. Perante isso o Governo não reduz a carga, mas decide fazer o choque tecnológico, a Ota e o TGV, gastando nisso ainda mais dinheiro. É como se o elefante sentado no ninho tentasse piar como uma perdiz.O senhor primeiro-ministro ainda não viu, pois, que o único problema do País é ele. Não tem obviamente a culpa, mas sem dúvida que a responsabilidade é sua.

João César da Neves DN 15.05.2006

sexta-feira, maio 12, 2006

"Norte nome de Portugal"

Primeiro, as verdades. O Norte é mais Português que Portugal. As minhotas são as raparigas mais bonitas do País. O Minho é a nossa província mais estragada e continua a ser a mais bela. As festas da Nossa Senhora da Agonia são as maiores e mais impressionantes que já se viram.

Viana do Castelo é uma cidade clara. Não esconde nada. Não há uma Viana secreta. Não há outra Viana do lado de lá. Em Viana do Castelo está tudo à vista. A luz mostra tudo o que há para ver. É uma cidade verde-branca. Verde-rio e verde-mar, mas branca. Em Agosto até o verde mais escuro, que se vê nas árvores antigas do Monte de Santa Luzia, parece tornar-se branco ao olhar. Até o granito das casas. Mais verdades. No Norte a comida é melhor. O vinho é melhor. O serviço é melhor. Os preços são mais baixos. Não é difícil entrar ao calhas numa taberna, comer muito bem e pagar uma ninharia. Estas são as verdades do Norte de Portugal. Mas há uma verdade maior. É que só o Norte existe. O Sul não existe. As partes mais bonitas de Portugal, o Alentejo, os Açores, a Madeira, Lisboa, et caetera, existem sozinhas. O Sul é solto. Não se junta. Não se diz que se é do Sul como se diz que se é do Norte. No Norte dizem-se e orgulham-se de se dizer nortenhos. Quem é que se identifica como sulista? No Norte, as pessoas falam mais no Norte do que todos os portugueses juntos falam de Portugal inteiro.

Os nortenhos não falam do Norte como se o Norte fosse um segundo país. Não haja enganos. Não falam do Norte para separá-lo de Portugal. Falam do Norte apenas para separá-lo do resto de Portugal. Para um nortenho, há o Norte e há o Resto. É a soma de um e de outro que constitui Portugal. Mas o Norte é onde Portugal começa. Depois do Norte, Portugal limita-se a continuar, a correr por ali abaixo. Deus nos livre, mas se se perdesse o resto do país e só ficasse o Norte, Portugal continuaria a existir. Como país inteiro. Pátria mesmo, por muito pequenina. No Norte. Em contrapartida, sem o Norte, Portugal seria uma mera região da Europa. Mais ou menos peninsular, ou insular. É esta a verdade. Lisboa é bonita e estranha mas é apenas uma cidade. O Alentejo é especial mas ibérico, a Madeira é encantadora mas inglesa e os Açores são um caso à parte.

Em qualquer caso, os lisboetas não falam nem no Centro nem no Sul - falam em Lisboa. Os alentejanos nem sequer falam do Algarve - falam do Alentejo. As ilhas falam em si mesmas e naquela entidade incompreensível a que chamam, qual hipermercado de mil misturadas, Continente.

No Norte, Portugal tira de si a sua ideia e ganha corpo. Está muito estragado, mas é um estragado português, semi-arrependido, como quem não quer a coisa. O Norte cheira a dinheiro e a alecrim. O asseio não é asséptico - cheira a cunhas, a conhecimentos e a arranjinho. Tem esse defeito e essa verdade. Em contrapartida, a conservação fantástica de (algum) Alentejo é impecável, porque os alentejanos são mais frios e conservadores (menos portugueses) nessas coisas.

O Norte é feminino. O Minho é uma menina. Tem a doçura agreste, a timidez insolente da mulher portuguesa. Como um brinco doirado que luz numa orelha pequenina, o Norte dá nas vistas sem se dar por isso.

As raparigas do Norte têm belezas perigosas, olhos verdes-impossíveis, daqueles em que os versos, desde o dia em que nascem, se põem a escrever-se sozinhos. Têm o ar de quem pertence a si própria. Andam de mãos nas ancas. Olham de frente. Pensam em tudo e dizem tudo o que pensam. Confiam, mas não dão confiança. Olho para as raparigas do meu país e acho-as bonitas e honradas, graciosas sem estarem para brincadeiras, bonitas sem serem belas, erguidas pelo nariz, seguras pelo queixo, aprumadas, mas sem vaidade. Acho-as verdadeiras. Acredito nelas. Gosto da vergonha delas, da maneira como coram quando se lhes fala e da maneira como podem puxar de um estalo ou de uma panela, quando se lhes falta ao respeito.

Gosto das pequeninas, com o cabelo puxado atrás das orelhas, e das velhas, de carrapito perfeito, que têm os olhos endurecidos de quem passou a vida a cuidar dos outros. Gosto dos brincos, dos sapatos, das saias. Gosto das burguesas, vestidas à maneira, de braço enlaçado nos homens. Fazem-me todas medo, na maneira calada como conduzem as cerimónias e os maridos, mas gosto delas. São mulheres que possuem; são mulheres que pertencem.

As mulheres do Norte deveriam mandar neste país. Têm o ar de que sabem o que estão a fazer. Em Viana, durante as festas, são as senhoras em toda a parte. Numa procissão, numa barraca de feira, numa taberna, são elas que decidem silenciosamente. Trabalham três vezes mais que os homens e não lhes dão importância especial. Só descomposturas, e mimos, e carinhos. O Norte é a nossa verdade. Ao princípio irritava-me que todos os nortenhos tivessem tanto orgulho no Norte, porque me parecia que o orgulho era aleatório. Gostavam do Norte só porque eram do Norte. Assim também eu. Ansiava por encontrar um nortenho que preferisse Coimbra ou o Algarve, da maneira que eu, lisboeta, prefiro o Norte. Afinal, Portugal é um caso muito sério e compete a cada português escolher, de cabeça fria e coração quente, os seus pedaços e pormenores.

Depois percebi. Os nortenhos, antes de nascer, já escolheram. Já nascem escolhidos. Não escolhem a terra onde nascem, seja Ponte de Lima ou Amarante, e apesar de as defenderem acerrimamente, põem acima dessas terras a terra maior que é o "O Norte". Defendem o "Norte" em Portugal como os Portugueses haviam de defender Portugal no mundo.

Este sacrifício colectivo, em que cada um adia a sua pertença particular - o nome da sua terrinha - para poder pertencer a uma terra maior, é comovente. No Porto, dizem que as pessoas de Viana são melhores do que as do Porto. Em Viana, dizem que as festas de Viana não são tão autênticas como as de Ponte de Lima.

Em Ponte de Lima dizem que a vila de Amarante ainda é mais bonita. O Norte não tem nome próprio. Se o tem não o diz. Quem sabe se é mais Minho ou Trás-os-Montes, se é litoral ou interior, português ou galego? Parece vago. Mas não é. Basta olhar para aquelas caras e para aquelas casas, para as árvores, para os muros, ouvir aquelas vozes, sentir aquelas mãos em cima de nós, com a terra a tremer de tanto tambor e o céu em fogo, para adivinhar.

O nome do Norte é Portugal. Portugal, como nome de terra, como nome de nós todos, é um nome do Norte. Não é só o nome do Porto. É a maneira que têm de dizer "Portugal" e "Portugueses". No Norte dizem-no a toda a hora, com a maior das naturalidades. Sem complexos e sem patrioteirismos. Como se fosse só um nome. Como "Norte". Como se fosse assim que chamassem uns pelos outros. Porque é que não é assim que nos chamamos todos?

Miguel Esteves Cardoso in K, Nº 2, Novembro de 1990

Centenário do nascimento de Agostinho da Silva



"Do que você precisa, acima de tudo, é de não se lembrar do que eu lhe disse; nunca pense por mim, pense sempre por você, fique certo de que mais valem todos os erros se forem cometidos segundo o que pensou e decidiu do que todos os acertos, se eles forem meus, não são seus. Se o Criador o tivesse querido juntar muito a mim não teriamos talvez dois corpos distintos ou duas cabeças também distintas.

Os meus conselhos devem seguir para que você se lhes oponha. É possivel que, depois da oposição, venha a pensar o mesmo que eu; mas, nessa altura, já o pensamento lhe pertence. São meus discípulos, se alguns tenho, os que estão contra mim; porque esses guardam no fundo da alma a força que verdaddeiramente me anima e que mais desejaria transmitir-lhes a de não se conformarem"

In: Sete cartas a um jovem filósofo, 1945

sexta-feira, maio 05, 2006

"Desenrascanço" na Wikipédia

Desenrascanço (...) is a Portuguese word used to express an ability to solve a problem without the adequate tools or proper technique to do so, and by use of sometimes imaginative resourcefulness when facing new situations. Achieved when resulting in a hypothetical good-enough solution. When that good solution escapes us we get a failure (enrascanço - entanglement). Most Portuguese people strongly believe it to be one of their most valued virtues and a living part of their culture.

Nenhum vento sopra a favor, de quem não sabe para onde ir. [Séneca]

«[o] que por cá não compreendemos é qual o fio político, a ideia de Estado e de país que anima o Governo e em particular José Sócrates". "Linhas de rumo", por José Manuel Fernandes (PÚBLICO, 1.5.2006: 5):

TGV: A saga continua...

Governo tenta justificar o injustificável.